Por dra. Denise Bousfield*
O Dia Internacional de Combate ao Câncer Infantil, 15 de fevereiro, tem como objetivo aumentar a conscientização e a educação sobre a doença, além de influenciar os governos e as pessoas para que se mobilizem em relação a causa. Mundialmente, cerca 8 milhões de pessoas foram diagnosticadas com algum tipo de câncer no ano de 2018. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), seguindo a projeção, esse total será de 29 milhões em 2040.
Em relação ao câncer infantojuvenil, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer estima que, no mundo, todos os anos 215 mil casos novos são diagnosticados em crianças menores de 15 anos e cerca de 85 mil em adolescentes, entre 15 e 19 anos.
A projeção do Instituto Nacional do Câncer (Inca) para o Brasil é que para cada ano ocorram, aproximadamente, 625 mil casos novos de câncer (450 mil casos novos sem considerar o câncer de pele não melanoma).
Foi estimado ainda pelo Inca para triênio 2020-2022, 8.460 casos novos de câncer infantojuvenil (0-19 anos), sendo 4.310 para o sexo masculino e 4.150 para o sexo feminino.
Os dados estatísticos do Registro Nacional de Câncer, processados e consolidados pelo Inca, trazem estimativas por regiões e estados, e apontam as Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste com maior número de casos atendidos da doença em crianças. Este maior número de casos pode ser explicado por ser a Região Sudeste mais populosa, mas também pode estar relacionado à migração de pacientes de outras regiões, em busca de centros de referência para o tratamento do câncer pediátrico, por exemplo, localizados em São Paulo e Brasília. Atualmente, 7,6 milhões de pessoas no planeta morrem em decorrência da doença a cada ano. No Brasil, assim como nos países desenvolvidos, o câncer já representa a primeira causa de morte (8% do total) por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos.
Diferentemente de muitos cânceres que ocorrem nos adultos, não há evidências científicas, até o momento, de que os fatores de risco relacionados ao estilo de vida influenciem o risco de a criança desenvolver a doença, sendo assim, fundamental o diagnóstico precoce, bem como o imediato início do tratamento em centros de referência pediátrico, visando melhores resultados.
As neoplasias malignas na criança tendem a apresentar menores períodos de latência, crescem quase sempre rapidamente e são geralmente invasivas, sendo assim, fundamental seu diagnóstico precoce. Portanto, a possibilidade de detecção do câncer em estádios mais localizados, permitirá redução das complicações agudas e tardias do tratamento, além de contribuir para maior percentagem de cura e de sobrevida. O câncer infantojuvenil geralmente afeta as células do sistema sanguíneo e os tecidos de sustentação. Nesta faixa etária, os tumores são predominantemente de natureza embrionária, constituídos de células indiferenciadas, o que, geralmente, proporciona melhor resposta ao tratamento.
No Brasil, os cânceres com maior incidência nas crianças e nos adolescentes são as Leucemias, os Tumores do Sistema Nervoso Central e os Linfomas.
Os sinais e sintomas do câncer infantojuvenil são geralmente inespecíficos e não raras vezes, a criança ou o adolescente pode ter o seu estado geral de saúde ainda não comprometido no início da doença, sendo fundamental, portanto, as consultas periódicas com o pediatra, visando o diagnóstico precoce da doença.
Alguns sinais e sintomas que podem estar relacionados ao câncer infantojuvenil estão listados na Tabela 1.
Tabela 1: Sinais e sintomas que podem estar relacionados ao câncer infanto-juvenil |
Aumento de volume em partes moles (história de trauma é comum, porém não tem relação de causa e efeito) |
Aumento de volume de testículo |
Cefaleia matutina, persistente, podendo estar associada a alterações neurológicas, diabetes insipidus, neurofibromatose, radioterapia prévia para tratamento de leucemia |
Dor abdominal, massa abdominal |
“dor de dente” rebelde ao tratamento |
Dor nas costas, que piora na posição supina, com ou sem sinais de compressão medular |
Dor óssea ou articular, especialmente se persistente e despertar a criança à noite, associada ou não a edema, massa ou limitação funcional |
Equimoses, petéquias e outros sangramentos inexplicados |
Estrabismo, nistagmo |
Excessivo ganho de peso |
Exoftalmia, equimose palpebral |
Febre prolongada de causa não identificada |
Hematúria, hipertensão arterial sistêmica |
Hepatoesplenomegalia |
Heterocromia, anisocromia |
Leucocoria ou “reflexo do olho do gato” |
Linfonodomegalias assimétricas, lembrando “saco de batatas” |
Linfonodomegalia cervical baixa em adolescente |
Linfonodomegalias, especialmente em região auricular posterior, epitroclear e supra-clavicular |
Nevos com modificação de características prévias, em áreas de exposição solar ou de atrito |
Obstrução nasal, sangramentos inexplicados |
Otalgia crônica e/ou otorréia crônica, especialmente se associado a dermatite seborreica |
Palidez, fadiga inexplicada |
Perda de peso inexplicada |
Prurido, sudorese noturna |
Pseudopuberdade precoce |
Sangramento vaginal |
Tosse seca, persistente |
O tratamento do câncer inicia com o diagnóstico e estadiamento corretos. Considerando a complexidade da doença, deve ser efetuado em centro especializado pediátrico, por equipe multiprofissional, compreendendo diversas modalidades terapêuticas (quimioterapia, cirurgia, radioterapia, imunoterapia, transplante de medula óssea e/ou de órgãos) aplicadas de forma racional, e individualizada para cada tipo histológico específico e de acordo com a extensão clínica da doença.
Considerando que a infância e a adolescência são períodos críticos do desenvolvimento em que, além da formação de hábitos de vida, a exposição a fatores ambientais pode afetar a estrutura ou a função de órgãos ou tecidos, comprometendo a saúde do adulto.
Por isso, é fundamental a orientação para esta população sobre os fatores de risco conhecidos para o câncer relacionados a exposições de longa duração, como a alimentação inadequada, a exposição à radiação ultravioleta sem proteção, o uso de tabaco e de álcool, a ausência da prática regular de exercícios físicos, a não-vacinação contra agentes infecciosos, como hepatite B e contra papilomavírus humano (HPV), e a prática sexual sem proteção.
*Presidente do Departamento Científico de Oncologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).